Reforma ministerial: sai a crise política, fica a crise econômica
A mudança de ministros anunciada por Dilma Rousseff tem o objetivo imediato de afastar a ameaça de impeachment
alimentada por manifestações de rua e adversários do governo. Ao abrir o
Palácio do Planalto a seguidores do ex-presidente Lula e incorporar
mais representantes do PMDB na equipe, ela se reforça no Congresso. Um
fortalecimento obtido no mesmo instante em que o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, uma peça-chave no impeachment, agoniza em praça pública.
Com a crise política aparentemente controlada, a
presidenta acredita ser possível virar a página do fantasma de sua
cassação e enfrentar outro problema, tão ou mais complicado. “Nós
precisamos sim de estabilidade política para fazer o país voltar a
crescer, e crescer mais rapidamente”, disse no discurso da reforma
ministerial. “Esperamos que o reequilíbrio fiscal a ser aprovado pelo
Congresso e o controle da inflação em processo garantam a retomada do
crescimento.”
Na economia, a primeira missão do novo arranjo político
governista será impedir o Congresso de derrubar veto de Dilma à lei de
aumento de salário no Poder Judiciário. O reajuste varia de 53% a 78%. A
análise do veto está prevista para a semana que vem. “Será um teste. Aí
nós vamos ver como essas medidas [reforma ministerial e administrativa] vão funcionar”, diz o líder do governo no Senado, Delcídio Amaral (PT-MS).
Os parlamentares têm sido pressionados há semanas por
um forte lobby de servidores do Judiciário. Se cederem, o País terá um
gasto extra de 25 bilhões de reais em quatro anos e de 10 bilhões anuais
dali em diante. Segundo um estudo recente feito por um professor da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, o Brasil é campeão de
despesas com a Justiça, 1,3% do PIB. O segundo lugar está bem distante, a
Venezuela (0,34%). A Alemanha gasta 0,32%, o Chile, 0,22%, os EUA,
0,14%.
Outra batalha dos governistas na economia será recriar a
CPMF. Sem o tributo, o governo diz que o orçamento de 2016 não fecha.
Após ser empossado, o novo ministro da Saúde, Marcelo Castro,
um deputado do PMDB, defendeu a CPMF. O novo titular das Comunicações,
André Figueiredo, líder do PDT na Câmara, também defendeu mais impostos,
embora tenha preferido citar a taxação dos bancos, donos de lucros
recordes num ano em que a economia brasileira encolherá de 2,5% a 3%.
Enquanto houver dúvidas sobre as contas públicas, será
difícil o empresariado tirar dinheiro do bolso e investir em obras ou
ampliação da produção. Graças ao “mercado” e o poder deste de
influenciar a política econômica a partir da situação do caixa do
governo, não se sabe ao certo qual será o tamanho da inflação, o valor
do dólar, o ritmo do mercado de trabalho e a evolução da renda das
pessoas.
Neste caso, para os empresários, melhor aplicar no sistema
financeiro.
A incerteza sobre as contas públicas também afeta a
capacidade de investimento do Estado, variável fundamental na retomada
(ou não) do crescimento. Em documento lançado na segunda-feira 29 por
entidades defensoras de mudança de rumo na política econômica, um dos
aspectos citados como decisivos foi a recomposição da capacidade
financeira estatal.
O fôlego financeiro do Estado foi afetado pelo ajuste fiscal do ministro da Fazenda, Joaquim Levy.
Centrado no corte de gastos, o ajuste produziu recessão e, por tabela,
derrubou a arrecadação federal, de estados e dos municípios. No Brasil, a
maior parte dos impostos nasce da taxação do consumo.
Segundo o documento contra a atual política econômica, o ajuste deveria
ser feito com crescimento, ou seja, com aumento da arrecadação
decorrente da expansão econômica.
A proposta orçamentária do ano que vem foi enviada
originalmente ao Congresso com previsão de déficit fiscal de 30 bilhões
de reais, embora depois o governo tenha providenciado medidas extras
para converter o rombo em uma sobra de 34 bilhões.
Para este ano, a situação será pior do que o esperado.
Em julho, o governo já havia anunciado um “ajuste” no ajuste fiscal de
Levy. Se antes pretendia economizar 66 bilhões de reais, a meta caiu a 8
bilhões. Agora, já há na equipe econômica quem considere inevitável um déficit em 2015, resta saber o tamanho. Na
quarta-feira 30, estatísticas mensais do Banco Central revelaram um
rombo de 7 bilhões de reais em agosto e de 1 bilhão no acumulado desde
janeiro.
Durante as discussões da reforma ministerial,
houve quem defendesse que Dilma trocasse também o ministro da Fazenda.
Foi o caso do líder do PT na Câmara, Sibá Machado, e do líder do PSD na
Casa, Rogério Rosso. O líder do PDT no Senado, Acir Gurgacz, subiu à
tribuna da Casa e disparou: “A política econômica do governo já foi.
Está na hora de mudar inclusive de ministro”.
Durante um jantar com líderes e dirigentes do
PCdoB dias atrás, Dilma Rousseff foi confrontada com a ideia de demitir
Levy. Um dos presentes descreveu a reação dela como “impassível”.
Fonte, CartaCapital
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