RIO - A proposta da defesa do traficante Antônio Francisco
Lopes, o Nem, de um acordo junto à Segurança do estado para reduzir os
índices de criminalidade foi alvo de fortes críticas de entidades da
classe, associações de juízes e do Ministério Público do Rio. Anteontem,
na sede da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas
(Abracrim), Jaime Fusco, um dos que defendem o criminoso, disse que se
colocava à disposição do governo do Rio para buscar uma solução para a
violência. Por trás da tentativa de aproximação, estaria uma negociação
para trazer o traficante, que está num presídio federal em Rondônia, de
volta para o estado.
Fusco afirmou, na segunda-feira, que poderia ajudar o
estado. “Somos autoridades e sabemos que podemos ser melhor aprovados
pelo estado para haver esse diálogo”, chegou a dizer o criminalista, que
era da comissão de segurança da Abracrim, função da qual foi destituído
ontem. Segundo Fusco, com Nem de volta à cidade, seria possível
diminuir até os roubos de cargas, uma vez que a favela da Pedreira, em
Costa Barros, onde mais ocorre este tipo de crime, é da mesma facção
criminosa do bandido.
Na opinião da presidente da Associação de Magistrados do
Estado do Rio de Janeiro (Amaerj) e vice-presidente institucional da
Associação dos Magistrados Brasileiros, a juíza Renata Gil, a proposta
de acordo é absurda. Segundo ela, é preciso buscar apoio do governo
federal para se combater a criminalidade no estado.
— Somos contra qualquer tipo de acordo com a criminalidade,
pois vivemos num estado democrático de direito. Não vejo que o caminho
para conter a violência no Rio seja um acordo com chefes de organizações
criminosas. Ficou claro que as forças do estado são insuficientes para
dar segurança à população, mas não é por isso que iremos aceitar
propostas absurdas. Os chefes de facções querem voltar à cidade porque
estão incomodados pelo fato de estarem longe dos territórios que ainda
têm sob domínio. Os presídios federais são importantes para isolá-los —
disse a magistrada.
Sobre a alegação da defesa de Nem de que o traficante
estaria fora do estado de origem além do tempo previsto na Lei de
Execuções Penais (LEP), a juíza não quis discutir a questão. Segundo
ela, cabe ao juiz decidir sobre o caso:
— Na minha experiência de mais de 20 anos atuando na área
criminal, não vejo garantia alguma em acordos com bandidos. O preso tem
que cumprir a sua condenação dentro da lei. O problema da criminalidade é
estrutural, antigo e precisa de um grande esforço nacional para ser
resolvido.
O procurador-geral de Justiça, Eduardo Gussem, também
afirmou que o compromisso do Ministério Público é com a “defesa
intransigente” do estado democrático de direito.
— A referida proposta é inconcebível. O Ministério Público
não reconhece a legalidade desse tipo de acordo. O cumprimento da pena
por parte dos presos condenados deve obedecer aos princípios
constitucionais e às normas previstas na Lei de Execução Penal —
ressaltou Gussem.
Juiz da Vara de Execuções Penais (VEP) do Rio, Rafael
Estrela entende que uma decisão judicial não permite negociação com as
partes. Ele lembra que o preso vai para um presídio federal por
necessidade de segurança do Estado e que a decisão cabe à VEP. Para o
presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil, Roberto Veloso,
não há a necessidade de acordos com as defesas de presos. Basta o
cumprimento da lei:
— Quem decide sobre a conveniência e a oportunidade de os
presos serem transferidos para presídios federais é o juiz da execução
penal. O preso tem um prazo de permanência de até 360 dias, período em
que a medida pode ser prorrogada, desde que o juiz da VEP requeira. O
juiz federal só analisa se a documentação está correta e se persistem os
motivos para a permanência dele na unidade prisional federal.
Presidente da Comissão de Segurança Pública da OAB-RJ, o
criminalista Breno Melaragno disse que o acordo proposto pelo advogado
de Nem não representa a posição da entidade.
Na reunião da Abracrim em que Fusco fez a proposta, estavam
cerca de 30 criminalistas. Ontem, o presidente da associação, James
Walker, se pronunciou sobre o fato, após destituir o advogado de Nem da
presidência da Comissão de Segurança Pública da entidade:
— A Abracrim não será interlocutora entre presos e autoridades da segurança pública.
A Secretaria de Segurança não quis se pronunciar sobre o
assunto. Nesta terça-feira, Fusco disse apenas que exige o cumprimento
da Lei de Execuções Penais.
Fonte, O Globo
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